sábado, 24 de março de 2012

A vida não é tão simples assim (01)

"O sintoma é o significante de um SIGNIFICADO  recalcado da consciência do sujeito" (JACQUES LACAN)

Há um bom tempo atrás, muito antes de eu conhecer a psicanálise, e fazer dela a minha prática, eu costumava dizer:

"a vida é simples... somos nós, QUEM a complicamos"
Mas hoje, com uma O'utra compreensão de mundo, entendo que SIMPLES mesmo ―é falar que  a vida, com toda sua complexidade, é simples.
Em se tratando de ser humano, nada é tão simples assim...

Enquanto eu andava distraído, o acaso me trouxe uma música bem conhecida que me fez pensar nesta postagem:
"Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer...
Queria ter ACEITADO As pessoas como elas são"
  Muitas e muitas pessoas passam a vida declamando o verbo "dever", especialmente no pretérito imperfeito (indicativo):
EU devia
TU devias
ELE(a) devia
NÓS devíamos
VÓS devíeis
ELES(as) deviam
 E esse "DEVER" é tão abrangente (abran-gente) que a gente, por diversas vezes, não percebe que significados está intrínseco ao verbo:
(do latim debeo, -ere)

1. Estar obrigado a.
2. Ser necessário.
3. Ter de suceder.
4. Ter dívidas.
5. Ser provável que.
6. Ter a dívida de.
7. Estar reconhecido (a alguém) por.
8. Acto. que tem de se executar em virtude de ordem, preceito ou conveniência.
9. Obrigação. (PRIBERAN, 2010)

 O interessante de se observar é que embora se chegue a conclusão de que não vale mais à pena chorar pelo leite derramado, ainda assim, continuam nada fazendo de diferente... Ou seja, ou continuam contemplando o leite, ou continuam derramando mais leite. Quem sabe na esperança de que alguém o ajude a enxugar o que ja fora derramado; ou até mesmo (e mais provável seja) que gostem de expor seu lamento cantando que:
"Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr
Devia ter me importado menos
Com problemas pequenos
Ter morrido de amor..."
Um exemplo muito claro, é num relacionamento...
Quantas pessoas estão com o mesmo tipo de namorado(a) repetindo a mesma novelinha de sempre, após tantos anos de "experiencia"?... A vida parece simples não é mesmo?... simples mesmo seja talvez, empurrá-la com a barriga.

Outro exemplo pode ser dado em relação ao amor ao perigo. Quantas pessoas "adoOoram o perigo"...  já sofreram com assaltos, roubos, sequestros, abusos, acidentes e continuam na mesma vida perigosa de sempre... praticando o mesmo tipo de esporte, dirigindo na mesma velocidade (não recomendada), comendo o que não pode, convivendo com quem ou com o quê, lhe é perigoso.
A vida não é tão simples assim.
se fosse tão simples, bastava saber do teor da gravidade a que se expõe, para parar de beber, fumar, conviver com o inimigo e etc...
Simples mesmo, é FALAR:
―deixe de beber!
―deixe de fumar!
―deixe de usar isso e aquilo, e etc...

Mas... pra quem está na pele... não é tão fácil sair da vida danosa que leva... porque não é uma simples questão de DECISÃO... ninguém nasce pra um dia DECIDIR que 
"a partir de hoje vou fumar..."
"a partir de hoje vou ser discriminado"
"a pertir de hoje, vou fazer vergonha a meus familiares" etc...etc...etc...
A vida não é tão simples assim.
Talvez seja mais simples falar que ―É simples.
Talvez seja mais fácil viver ao acaso como continua insistindo aquela velha musiquinha do "DEVIA":
"O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído"
Para os que não conhecem essa música, e desejarem conhecê-la, eu a postei abaixo do texto, na parte das referências.

Difícil é reconhecer que precisa de ajuda... (e procurar ajuda)
Difícil é conhecer-se a SI mesmo...
Difícil é encontrar-se por acaso
Porque trabalhosa é a luta que se trava consigo mesmo embusca do EU desconhecido, que não dá-se a conhecer de qualquer jeito, porque muitas vezes, nem quer  conhecer-se... 

Deve haver um Desejo, íntimo e pessoal de busca... de lugar... de encontro....
e este encontro não está em qualquer lugar ao acaso, nem ao ocaso... mas num caso analítico de SI mesmo, que se dá num compromisso  e numa entrega do sujeito  entre as paredes do seu ser.
 Aonde se busca, é uma questão pessoal... muitos têm-se buscado nas letras, nas canções, nos blogs, nos ídolos, no sistema, enfim... em algum lugar... O importante é encontrar O lugar... o lugar do tesouro dos significantes... e encontrando ―brotarão os significados, para a vida.

E no lamento dos "devia... devia... devia...devia..." que esta música traz, que bom que alguns, mesmo que a menoria (em relação ao todo)  percebem que seu maior D-V
é:
Dar-se a
Vida... (a si mesmo).
[texto de:]
OBSERVAÇÕES e REFERÊNCIAS:

Obs: escrevi uma continuação para este texto, disponível no link a seguir:



LACAN, J. (1901-1981). Escritos. Rio de janeiro : Jorge Zahar Ed., 1998.

4 comentários:

  1. A complexidade está em nós, em nosso doloroso caminho de investigação interior, de reconhecer-se, de reencontrar-se, de explorar o que quase ninguém faz sua essência interna. É um caminho que vai derrubando muitos obstáculos, pois olhar-se no "espelho" de si e se enxergar é extremamente delicado, mas necessário. Do contrário viveremos a margem de nós mesmos.
    Sempre serei grato por este blog, e principalmente pelo Criador dele, por trazer conteúdo útil para a sociedade.

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    1. Obrigado pelas pelo elogio Alvaro. Fico muito agradecido pela gentileza do comentário; e feliz por este blog estar conseguindo trazer um conteúdo produtivo. Para mim, como autor, é importante saber que impressões que as postagens têm deixado na percepção dos leitores.
      ___
      No seu comentário, você falou de "vivermos a margem de nós mesmos"... Me deu uma ótima idéia! Será o tema da minha próxima postagem, logo após a 3ª parte dos textos que estou publicando com o mesmo título de hoje.
      Mais uma vez obrigado. Acho que na próxima 4ªfeira tem postagem nova.

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  2. A mente humana é um labirinto obscuro, onde no ponto mais profundo existe uma insatisfação, um arrependimento, uma frustração e medos, é como uma caixinha a sete cadeados guardando segredos que não lhe cabe falar ou deixar que alguém a descubra. Vive numa linha do tempo correndo desesperado por uma resposta que nunca vem, suas decisões são precipitadas, suas atitudes impensadas, não sabe e não conhece o seu ser, é um estranho num mundo do invisível dos porquês, e não consegui descobrir o seu infinito se não buscar entender e compreender a si mesmo, e descomplicar o complicado de seus próprios desejos inconscientes.

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  3. É verdade Fernanda, a mente humana é uma caixinha de segredos num oceano de mistérios.
    _________
    Obrigado por sua participação. Já há uma continuação deste tema, num outro texto postado recentemente... quando puder, também está convidada a conferir.Abraço.

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